MEMÓRIA(S)
E POLÍTICA NO CENTENÁRIO DE LEONEL BRIZOLA (1922-2022)
Prof.
Dr. Antônio Fernando de Araújo Sá
Departamento
de História
Universidade
Federal de Sergipe
Nosso
desejo de convocar essa memória serve de ponto de partida para imaginar o
futuro do Brasil, em um momento em que a tradição latina do saeculum
emerge como possibilidade de se repensá-lo, em suas múltiplas facetas, como no
caso do centenário da Semana de Arte Moderna, do Partido Comunista Brasileiro
ou do bicentenário da Independência.
Nascido
no dia 21 de janeiro de 1922, no Rio Grande do Sul, Leonel Brizola foi
protagonista na história republicana brasileira na segunda metade do século XX
e início do século XXI, sendo que, quando de sua morte em 2004, a imagem mais
recorrente de sua presença política “foi a de um defensor da legalidade
institucional e da democracia”, especialmente pela coragem para enfrentar os
militares golpistas que tentaram impedir a posse de João Goulart, em 1961, após
a renúncia de Jânio Quadros. Considerado o último levante gaúcho, a vitoriosa
Campanha da Legalidade representou sua assunção como líder da política
nacional, demonstrando que ser possível derrotar um movimento militar golpista,
a partir de intensa mobilização popular (FERREIRA, 2016: p. 25). Como afirmou
Ângela de Castro Gomes (2016: p. 303), “não importa que ele não tenha tido tais
posições ao longo de toda sua vida política (...). O fato de Brizola ter
pendores autoritários (...) não diminui sua marca e contribuições políticas
para o país”.
Os
percalços da primeira e dificílima experiência de democracia de massas no
Brasil, no período de 1945-1964, podem contribuir para compreender a
fragilidade da democracia representativa de corte liberal no país,
especialmente após o golpe de 2016 e a eleição de Jair Bolsonaro, em 2018.
Ontem como hoje, as crises políticas nos momentos de disputas eleitorais à
presidência da República traziam tensões institucionais, em virtude de os
derrotados, nas urnas, questionarem os resultados, apelando para instâncias
judiciais e/ou procurando alianças com grupos militares insatisfeitos.
Outro
momento emblemático da vida política que teve sua participação evidenciada foi
durante a chamada Nova República (1985-2016). Herdeiro do trabalhismo da Era
Vargas, Brizola manteve a preocupação com a defesa dos direitos do trabalhador
e do nacionalismo, mas incorporou a questão democrática e a busca do socialismo
brasileiro, trazendo, ao mesmo tempo, temas como os negros, os índios, as
mulheres e os favelados para o centro do debate político. Esse novo trabalhismo
“encarnou-se no brizolismo” (GOMES, 2016: p. 307).
Brizola
e o Partido Democrático Trabalhista, criado no início dos anos 1980,
resistiram, com seu projeto nacional-estatista, às políticas neoliberais de
privatização do Estado, ao longo dos anos 1990. Entretanto, sua retórica não
mais galvanizava as massas com suas pregações cívicas, como outrora. As
derrotas eleitorais, do final da década de 1990, demonstravam que a força e o
carisma do líder trabalhista se restringiam as cidadelas carioca e gaúcha
(FREIRE, 2016: p. 203).
Sua
morte, em 2004, foi reveladora de “que Brizola pode ser pensado como um
estranho caso de liderança capaz de resgatar o caráter glorioso das tentativas,
frustradas, dos planos abortados, das batalhas perdidas, das histórias por um
fio (SENTO-SÉ, 2016: p. 15).
Esse
ato de memória como ação política supõe o exercício da liberdade de se oferecer
aos outros um diálogo de construção de novos sentidos da leitura do passado e
do presente. Portanto, lutar pela memória “seria precisamente interrogar o
presente e imaginar outro futuro” (2009: p. 62 e 63). Como bem notou Nelson
Werneck Sodré, a democracia está em perigo, com o neoliberalismo. “Ou o Brasil
acaba com neoliberalismo ou ele acaba com o Brasil” (SODRÉ, 1998: p. 120).
BIBLIOGRAFIA
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democracia e reformas: As ideias políticas de Leonel Brizola (1961-1964). In:
FREIRE, Américo e FERREIRA, Jorge. A Razão Indignada: Leonel Brizola em
dois tempos (1961-1964 e 1979-2004). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,
2016.
FREIRE, Américo. O fio da História:
Leonel Brizola e a renovação da tradição trabalhista no Brasil contemporâneo
(1980-1990). In: FREIRE, Américo e FERREIRA, Jorge. A Razão Indignada:
Leonel Brizola em dois tempos (1961-1964 e 1979-2004). Rio de Janeiro: Civilização
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GOMES, Ângela de Castro. Brizola e
o trabalhismo. In: FREIRE, Américo e FERREIRA, Jorge. A Razão Indignada:
Leonel Brizola em dois tempos (1961-1964 e 1979-2004). Rio de Janeiro:
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Carmen de la (org.). Memoria(s) y política: experiencia, poéticas y
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Aires: Prometeo Libros, 2009.
SENTO-SÉ, João Trajano. Prefácio.
In: FREIRE, Américo e FERREIRA, Jorge. A Razão Indignada: Leonel Brizola
em dois tempos (1961-1964 e 1979-2004). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,
2016.
SODRÉ, Nelson Werneck. A Farsa
do Neoliberalismo. 5ª. Edição. Rio de Janeiro: Graphia, 1998.
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